sábado, 29 de novembro de 2008

minhas partes à parte

boa parte do meu eu não é boa
boa parte do meu eu não sou nem eu
é algo indecifrável
algo de se desprende do auto-conceito


boa parte do meu eu
me trata como sendo eu
outra me retarda
me iludindo de mim mesmo


boa parte do meu eu não é nada
é apenas vácuo, ou uma constante de inconstância
a outra é menos ainda
é vazio, que dá frio
que dá medo
que me deixa sozinho de mim mesmo.


boa parte de mim é ruim
não a envergonho, constatando-a assim
afinal não devo ter vergonha.
(deveria eu ter vergonha de mim?)


boa parte de mim é confusa
sempre nas interrogações, nos convéns,
confins
a outra parte é só uma parte


boa parte de mim não está em mim
está em todos
no ar, na letra, papel
a outra parte está não estando
sempre se fazendo presente
a pontadas de lancinante dor


que sempre vem a me constatar (e lembrar)
que boa parte de mim se mostra
e a outra...
não se mostra nem à mim.


Rodrigo da C. Lima Bruni

terça-feira, 25 de novembro de 2008

o sentido do sem-sentido

depressão
de pressão
infusão de mágoa ao coração
divisão
de visão
ao ver as coisas como elas são
supressão
suspensão
de idéias que agora são
ora sim
ora não
conceitos perdidos do coração


Rodrigo da C. Lima Bruni

plenitude desejada

a fé
a dor
o riso
o rancor
o ódio
o temor...
que de súbito se faça
amor...


que de súbito me faça
ator
e que me prive deste acre
odor
assim me tornando
apenas matéria
viva, ainda que,
em miséria


que me prive de tal lancinante
dor
e me proporcione fulgurante
frescor
de vida que vive em simples
momentos
e não de dolorosos
rebentos


filhos do meu eu à mim concedido
do meu realmente ser
puro,
não difundido
que se apodere de mim
o sentimento,
apenas este
e que me faça menos inquieto
e que me faça, por assim dizer...

talvez completo.


Rodrigo da C. Lima Bruni

eu?

eu sou eu
subdividido em milhões de mim
um para cada eu
um para cada afim


eu sou eu
óbvio pensar assim
poderia ser outros, talvez
Fernando, José, Serafim


eu sou o talvez
martírio constante em mim
de tão penosa escassês
soma-se a indagação do fim


eu sou o sozinho
paz do meu corpo assim
paz de mente, não de coração
o coração resguardo só para mim


eu sou a tristeza
frio sentimento resgata o sim
sim à segurança do renascer,
me reviver a tristeza do dia, assim

eu sou...

eu?


Rodrigo da C. Lima Bruni

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

apenas a música...

sem estética
narcisismo
preocupação
ou vaidade
apenas a música
em lugar de
futilidade


e a autosuficiência
cadenciada pela melodia
todo dia
todo sol
todo ré
toda a música


toda só
só ela toda
que embora por uns amada
tem coração vago
e vaga em corações
e em emoções
e se torna só minha
que a considero uma mãe
ou uma mulher
ou o meu existir


música
que me entalho em carne viva
que a faço
cerca-viva
e que viva a me cercar
pois desta arte, apoderada
não pretendo, nunca
me livrar


Rodrigo da C. Lima Bruni

terça-feira, 18 de novembro de 2008

lamento

esses lapsos
que fustigam o ser
e se fazem ter
como que, colapsos


esses traços
que sei me abster
profundo pretender
porém escassos


esses passos
meus ao escurecer
já não são passos


são pássaros
que migram, no meu escurecer
incertos como meu escrever.


Rodrigo da C. Lima Bruni

crítica de mim para mim mesmo

analisando-me como escritor critico
me vejo como um nada
não um poético e lindo nada
apenas um nada
livre de elogios
um nada
que se atreve a assassinar
algo tão engenhosamente criado
e perenemente sacramentado
no papel
na letra
na métrica
na rima
(ou não)
um nada que de mim se faz garboso
convencido
a ponto de se achar bom naquilo que faz
um nada que se apodera do pouco que me resta
mastigando-me as estranhas
e as consumindo de nada
deixando-as ressequidas
insensíveis
tolamente poéticas
e falsamente poéticas...
esse nada me é companheiro
único e só
ele tem a mim
e dentro de mim, há ele
companheiro de ilusões
ao achar que à tudo isso acima descrito
alguém
em algum lugar
em determinado momento
beleza alguma, há de achar.


Rodrigo da C. Lima Bruni

domingo, 16 de novembro de 2008

espelho introspectivo

o olhar de dentro do meu olho, repousa:
à olhar para dentro do meu olho, que ousa
me mentir tudo que sou
tudo o que sei que vou
achar, quando
à dentro do meu olho olhar
e enxergar mais uma vez meu não-amar



o olhar de dentro do meu olho é cansado
é confuso, instigado
a se desfalecer por trás do cristalino
se mascarando (assim o imagino)
de tanto descolorir
tanto se esvair
tanto não-sentir



essa muralha,
de fora do meu olho,
é escassa, falhada
e a componho como um tolo.
Meu corpo, meu sorriso amarelo
são todos singelos
singela é minha alma ao assim se olhar



porém confuso sou eu ao assim me constar
ainda que acompanhado, sozinho
ainda que bem-amado, ressequido
ainda que bem-humorado, embriagado
ainda que eu, ninguém
ainda que ninguém, alguém
além disso, nem ao menos me convém



e assim...
o olhar de fora do meu olho, se choca
com o de dentro, que se joga
cada vez mais para dentro
cada vez mais para o nada
e assim me fada
a sutileza do olhar vazio
mais fácil, insípido
sem gosto de tristeza, alegria ou raiva
apenas a sutileza do nada
que vaga...
e vaga...
e vaga.


Rodrigo da C. Lima Bruni

domingo, 9 de novembro de 2008

pseudo-soneto de redenção à arte da palavra

pensei ter te perdido, palavra
e a chorei sem lágrimas, por semanas e semanas
lhe chorei porque és minha lavra
do "plante o amor e receba à quem amas".


és meu vazio inscrito
meu devaneio, meu visto
para a terra da arte fecunda
que quando desvirginada deslumbra


e a procurei, de tudo fiz
mesmo ao te saber inconstante, abstrata e incontestável
neguei ser lhe aprendiz


e regozijei-me o teu comando
mesmo sabendo que és tão volátil e desconhecida
como o amor de quem está amando.


Rodrigo da C. Lima Bruni

descoberta

quando conheci a palavra escuro
me vesti de medo
estupefei-me, mais tarde,
com seu negrume aconchego


quando conheci a palavra poesia
travesti-me em milhões de mim
ah, doce preâmbulo,
que me satisfaz como o odor de Jasmim


quando conheci a palavra arte
não tinha mais idéia do que me fazias
ao sussurrar melodias
de vidas, de tardes
hoje em dia, cristalino afirmo
és tudo o que me faz parte


Rodrigo da C. Lima Bruni

As duas e cinquenta e cinco

Às duas e cinquenta e cinco
cinquenta e cinco palavras me vêem
e me riem com desdém
ao deixar apenas duas que convém



Às duas e cinquenta e cinco
cinquenta e cinco mulheres me tocam
juntas exercem sua arte, e fofocam
que de cinquenta e cinco mulheres
apenas duas ao meu eu sufocam



Às duas e cinquenta e cinco
exerço cinquenta e cinco personagens que me abstêm
inconsciente saber
que nem ao menos dois, na verdade me tem



Às duas e cinquenta e cinco
eu escrevo o não dito
rimo como se por novos gritos
representasse, assim, outros indecisos



Rodrigo da C. Lima Bruni

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

ao desentendimento

Ó, raiva que queima meu coração
um momento digo que sim
outro digo que não
à febril raiva que queima meu coração.


dilacera minha razão
a boca exprime, em comunhão
todo ódio de um momento
e o convívio modorrento.
A razão do coração
toda em si, em convulsão
se recusa a retesar
e libera o meu pesar
de tal convívio modorrento
do qual afirmo ser detento
mas não pretendo escapar
da confusão desse estar


Ó, raiva que queima meu coração
um momento digo que sim
outro digo que não
à febril raiva que queima meu coração.


a criatura atacada, ressentida
se chocalha a profanar minha cina
insultos subversivos me vem
e me riem com desdém
riem proibições orgulhosas
que nada são senão formosas
à escapar de sua real aparência
de tamanha tristeza, carência
carência de se sentir em paz
coisa que, para ela, é leva-e-traz
triste, assim a afirmar
minha mãe: tanto pesar, tanto amar


Ó, raiva que queima meu coração
um momento digo que sim
outro digo que não
à febril raiva que queima meu coração.


se à tudo isso, soubesse acontecer
de toda raiva iria me conter
e assim teria minha paz
(que também sei ser leva-e-traz)
mas não!burro fui ao retrucar
com frases insinceras à metralhar
minha mãe, meu porto
e agora me rimo, torto
Pois agora, o caos feito
digo ao ódio em meu peito
"Infeliz! Tinha que à tudo isso fazer?
"Claro! Senão eu, mal algum iria ocorrer!.

...

e me ri, fraco que sou
ao deixar-me tomar conta
ao deixar-lhe a posse do que sou
maldito sejas por roubar minha paz!
e aqui, minha desculpa se desfaz
de versos de serenidade, outrora
à essas desculpas desfalidas de agora...


Ó, raiva que queima meu coração
um momento digo que sim
outro digo que não
à febril raiva que queima meu coração.


Rodrigo da C. Lima Bruni

terça-feira, 4 de novembro de 2008

monólogo

e então alguém tenta te convencer
ao amor do amar
sempre estipulando
os benefícios dessa bem-aventurança
sempre traçando linhas paralelas
entre a felicidade e o eterno
entre a beleza e complementação do ser
entre a morte, entre a vida



e então alguém te diz errado
meio estranho
complexado, traumatizado talvez
e mais uma vez te estimula
a procurar por esse nada
por essa viga de sustentação
por essa desculpa comprada pelos preguiçosos
que nem ao menos se dão ao trabalho de parar pra pensar



afinal, que desculpa cai tão engenhosamente bem
como uma dor de amor?
que desvio, segue vertiginosamente para cima
(quando na verdade, para baixo)
como o amor?
qual é o maior estímulo para se resolver na vida
seja intelectualmente, financeiramente...sentimentalmente
como o amor?



nenhum.



este é o mentiroso mais consumido no mundo
o doador universal de esperanças, de metas
o receptor universal de dor, angústia
ou não!
talvez receptor de felicidade e resolução
(ainda que ilusórias,
falhas
e com um quê de porém; contraditório como sempre)



não há amor, no amar
não o amor que reza-se em lendas
não, esse nunca existiu
se o fez, extinguiu-se tempo o suficiente para mover alguns fiéis
e estes disseminar o legado dessa praga ilusória pelo mundo
sempre servindo como apoio para alguns
meta para outros
e até como sonho



o amar é capitalismo
ou sexo
ou medo de viver só
ou medo de não viver sem ele
ou medo de subexistir
ou somente amar
sem sentimento, magia ou perfeição alguma
somente amar.



e então alguém tenta te convencer...
e consegue
você cai
e tudo isso muda
tudo é lindo, tudo é amor
até que você acorda do seu conto de fadas
e volta pra realidade
até que, novamente, alguém tente te convencer...


Rodrigo da C. Lima Bruni

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

antagonia

o amar, o amor
o ódio, o rancor
sentimentos quase irmãos,
gêmeos
não fosse pelo limiar
persistente entre eles



o limiar entre o ódio e o amor
um simples ato, falho ou convicto
pode, ao ódio, transformar o amor
e gerar desgaste, rancor...
mas espere!
quem ama não agoniza, também ao rancor?



que diferença se faria presente, então,
entre esses dois opostos?
o estupor do amor
o dilacerar do ódio
a angústia do rancor...
nenhuma diferença há de ter



ao menos, não às pessoas realistas
insensíveis
racionais
e indiscutivelmente certas...
ódio e amor são, de fato
irmãos



andam de mãos dadas o tempo todo
e um se faz presente para ser lembrado o outro
pois são irmãos, querem bem uns aos outros
e somente os racionais,
os pseudo-frios
os não-sentimentais os descobrem assim



o que há são ápices
nos quais um sobrepõe-se
ocultando o outro
puro egoísmo
egocentrismo
uma pena que se aplique até á irmãos



amor e ódio
são como noite e dia
caso não houvesse esse paradoxo
paradigma de antítese,
tudo seria ódio
tudo seria amor



ou tudo seria tudo
frio, onipotente
auto-suficiente
e vazio...
como o peito de quem, assim,
os escreve


Rodrigo da C. Lima Bruni

desperdício de linhas

regras...
regras para se sentir
regras para se portar
regras para se gostar
regras para se casar



regras para trabalhar
regras para se divorciar
regras para defecar
regras para urinar
regras para se falar



estúpidas, um milhão de regras vêm a sucumbir
quando à hora da morte
chegada a hora de partir
injustiça, assim as ter
tanta regra pra viver
nenhuma regra para se morrer



Rodrigo da C. Lima Bruni

constatação

estou viciado,
fico triste a constar,
estar viciado
na droga do não amar


consumista, prepotente
exige tudo de você
tudo do todo
e no todo se mostra presente
gangrenando cada alegria
cada esperança
fazendo-as alergias
ao fado do homem,
o amar.


...o amar
o amor ao mar
o desidratar
ao amor do mar....


se faz tão persistente,
coerente
que se torna parte da razão
lei do ser vivente
à esta impõe a indiferença,
descrença
no potencial de viver o amar
de amar o viver


estou viciado, admito
e como toda droga
esta me suga,
me suja
e se dela não me libertar
com medo afirmo
que à sua semelhança
irei me tornar


Rodrigo da C. Lima Bruni

sábado, 1 de novembro de 2008

perde-ganha rotineiro

perde-se todo o amor de uma vida
para ganhar-se outro
talvez definitivo
indistinto à todo o bordão do pra sempre acaba
sutil, leve e sem tempestade
não acrobata
a desviar-se de todos os problemas e fazer-se verdadeiro,mentiroso.

perde-se toda esperança
para conseguir a solidez
sensatez,
indiferença à dor
e assim ser mais coeso
mais insensível
mais você mesmo
menos seu coração

perde-se todo o atentar para as cores
corpos,
formas
tipos e odores
para poder atentar pra dualidade do preto
do branco
do preto e branco
da auto-suficiência do inodoro

da vastidão insuficiente e inexata do insípido
da morte indesejável do indesejável
perdendo cada dia que passa um pedaço
do seu antigo existir
e dando sempre lugar a um novo
ao nojo do desamor
criando sempre um estojo
para guardar os cacos do sentir

ganha-se toda a experiência
desviando do desviar
amando o desamar
e acreditando no desacreditar
sólido mantêm-se o coração
inerte, calejado à ilusão
as pancadas
hematomas do viver

ganha-se a sensibilidade artística
poética
musical
em detrimento de toda uma vida de perde-ganha
ganha-se todo o vazio
para coexistir no cheio
no lotado
no vai e vem de sentidos e destinos

ganha-se o nada
para lembrar de quanto era doloroso, embora humano e amável o tudo
luta-se intrinsecamente contra esse conformismo
cogitando a possibilidade de ser normal outra vez
mas sabendo, inconscientemente
que de normal
humano , amável e capaz de amar

resta apenas a possibilidade.


Rodrigo da C. Lima Bruni