segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Retalho de ação

orvalho, pela manhã
acordo, durmo e acordo de novo
escarro, cuspo, bebo e lavo
café com pão
à agua encosto a mão
e do melado imputo o não
mais existir




talho, pela tarde
fruta solta polpa
bunda, que apalpo
morena que enlaço
camisa, feixe e botão
arrebenta, finda em explosão
de libido




tolho, pelo por do sol
a continuação, compromisso
saio de manso, mudo, canso
de dizer, não dizendo propriamente dito
me fito, esguio, espelho
cabelo, barba, pentelho
e me sou demasiadamente mais eu




corro, pela noite opção
à minha morada descansar
molho, de macarrão insosso
põe pitada, pito fumo, teto fosco
filho pródigo
falha minha:
esqueci o verbo amar;




ao menos amamos
amenos amáveis
verbos biodegradáveis


Rodrigo da C. Lima Bruni

Redação

Ontem eu acordei
matei cinco pessoas
fui entregar a droga na boca
pus um cigarro à boca
suicidei-me, pessoa louca!
esqueci que gente burra não tem futuro
não pode querer mudar
senão o futuro se põe a medrar
e fico só,
no passado,
puto à ladrar
debaixo
da terra
e se ela ainda fosse branca
morria feliz, cheio de esperança
de acordar
e matar mais uma criança
com a única bala que não vende no boteco



Rodrigo da C. Lima Bruni

arcos da lapa

vadia é a vida louca
sem dados nem nada
cai pela sarjeta, rola da escada
trôpega, bêbada, leviana
sem nem a morte sentir
levanta, se limpa e se põe a mentir
"não, um dia tomo tenência"
continua apesar de qualquer consequência
segue sua cina em direção ao seu centro de gravidade
mete o pé no acelerador, afunda a embrenhagem
quarenta, sessenta, cem
quarentena? dispensa resenha,
de motivos e sintomas;
descansa, muito puta
pra dia de semana, cair na labuta
posto que sexta é dia de farra
sábado é dia de farra
e domingo é um dia de fera
pois segunda é dia de terra,
nos pés, anda como louca
trabalha como louca
chega em casa, dorme e acorda
muito mal dormindo, e vai trabalhar
tão rotineiramente
que até noutra vida assim faria





amor, sabe lá ela
sabe dos dentes, dos horários e honorários
das constelações, causas e complicações,
da primeira segunda e porventura terceira guerra mundial
sabe do lamento nacional à morte do nacionalismo
desconfia de uma nova epidemia de egoísmo
se imuniza aos desgostos
opiniões dos outros
crises da economia
e casos da suína epidemia
se morre, pouco perde
se vive pouco ganha
amor, sabe ela, é coisa que não sabe nada
afinal, envaidecida, procura se aventurar por outras saias e blusas
sapatos e mangas
calcinhas e bundas
tendo como único amor, a vontade de se aventurar à vontade





vida é uma vadia louca.


Rodrigo da C. Lima Bruni

derivando amor (quando tende ao infinito)

o interminável invólucro envolvente do beijo de um segundo
quê seria dele sem o sentimento
sem o consentimento do tempo, por ele passar desapercebido;
muito tenho sabido sobre a sabedoria da salada de línguas
de fato tenho mais lambido o amor do que o amado, propriamente dito
é que se tendo algo interminável e envolvente
não se enche os olhos por algo finito e maçante, rotineiro e irritante
é que se tendo trem pra descarrilhar
o mesmo é muito mais emocionante do que no trilho galgar o rumo
sei lá, falta-me oxigênio demais
logo, penso com eloquência, figuras falsas
de falsa sapiência
tudo porque beijo um beijo interminável e inviolável de uns quinze minutos
e o beijo me beija outro beijo de mesma intensidade e sentido oposto
por eletrização, me arrepio à física das bocas em contato,
fluindo-se libidos
transfusando-se bactérias
transmutando-se da carne coração
do coração a adrenalina
da adrenalina a taquicardia
da taquicardia verbo, impulso nervoso:
amo, verbo beijar na primeira pessoa do elétrico infinito infinitivo particular presente
e por consequência beijo dois lábios molhados, que me beijam beijos molhados
me perco entre os quais se dividem em bocas
que me molham beijos nervosos
milhões de bocas de um lábio
trinta minutos...
trinta e cinco...
quarenta...
quarenta e cinco...




a interminável boca me envolve num invólucro envolvente de um segundo onipotente
pois da partilha de enésimos minutos
esse um segundo fracionado
me beijaria por toda minha vida
toda minha vida invólucra envolvida por um interminável beijo de um segundo



Rodrigo da C. Lima Bruni

quando paro e penso:

realmente
o pouco me atrai muito
quando muito penso,
me trai e as costas vira
fico estupefato
pútrido, petrificado
toco-o nas costas
tiro satisfação
tira-me de otário
aperta-me a mão
e me sorri, bobo, falso, fiel
o fel desgosto de se ser enganado
uma vez que anteposto
antecede-se esperto e ligeiro
se fazendo todo fagueiro pra minha anteposição
eu, que sei do que sabe
sabe lá, porque finjo que não
sabe Deus porque faço isso
sabemos aqui, que sou tão torto que faço que nem penso
penso que nem faço
e quando vejo nem lá, nem Deus nem aqui fiz algo
nem acolá
ah, se me visses à colar
notaria a destreza dos burros
e talvez menos me passasse a perna
talvez o menos me passe a perna porque sou negativo, sabe lá
sinal oposto se repele, não é mesmo?
sinal posto à pele, carga de mesmo sinal
sinal oposto à pele,
derme,
coro;
(coração)
sem mais aposto, declaro-me burro sem explicação
se o nau está posto, que eu vá lá ficar
eu e muito pouco
daí sim a prova dos nove constar
quereria a dos dez, se não fosse tão bobo
quis um querer auspicioso, há muito tempo
hoje quero qualquer pouco
em qualquer tempo






vamos ver com quantos poucos se faz um tanto






faz.



Rodrigo da C. Lima Bruni

quarta-feira, 15 de julho de 2009

desejos(o)

não amor, chega
por favor chega
chegue-se mais pra perto
pode vir sem tremor nem temor
não tema, tenha
pode vir
coloque sua mão sobre meu peito
o tanto pra se dizer chega
abrace-me com os olhos, sem chegar
ou com os próprios braços, se chegar
só não me chego mais pelo aconchego
pelo cheiro de monótono
pêlos cheios de monótonos
pinto cores neutras, quase sem cores
mas peço-lhe que venha colorida
para me fazer mais ácido, mais básico, o que for
mas que faça-me colorido ao invés de pálido
e faça o que quiser com as nuances
as use como brinquedo de plástico
plastifique-me à tua carne para que sinta tua transpiração
deduza-me prazeres para contradizer-te à mal gos(t)o ou não
introduza-me a vida molhada em revés para que te faça a mesma, ou sim
sim, de forma torta, sem forma, sem fôrma, sem nem ser ou servir
mas chegue
à menos que não queiras;
se caso for, cheque
se ao caso for, ame
se à casa for, não procure
estará por vielas sem rumo pra rumar, a minha presença
a menos que seja tua própria toca
tua touca de mulher coloque
sem medo nem enredo ame
se ao caso for, claro
ou se escuro for, caso
matrimonio-me à ti
feromônio-me, tão doce
ai de mim amargo e duro
mas o faço pelo simples desejo do vale
da água límpida que só lá escorre
me valho de acaso e me corro de precipitação
corre-me a vontade, deixa-te à vontade
querida, pelas montanhas, pelas planícies
tudo na estrada do teu corpo ao teu peito
ao teu bico, teu pico, selvagem, arisco
mas cheque
seja mate ou sem fundo
se não quiser, chega.




até porque não se conjuga apenas esse verbo na vida.


Rodrigo da C. Lima Bruni

quinta-feira, 11 de junho de 2009

colocação pronominal

próclise , mesóclise, ênclise
e o pronome vem sambando
o cavaco, o violão, a voz
e a mulata vem sambando




ela que,
nunca veio antes de mim
sem emparelha com o me
e dá um pontapé no eu
sempre na forma do gramático falho
que é ignorar a gramática escrita




o coração que nunca veio antes da mão
grudou no bom senso
e saltou o sexo
fez sexo com o juízo
e gerou o juízo não raciocinável
o juízo desajuizado



isso é amor pronominal
que nasce na ordem alterada do pronome coração.
amor de roda
de pandeiro e cuíca
amor brasileiro e gramatical




de vez em quando esse amor raiz
se samba por outros estilos de personificar o mundo
o vestido , o short, o jeans colado
a bunda, o peito, o rosto
e as vezes o vulgo vem até antes do senso
vulgo esse que também é amor sambado
fruto do sexo pelo sexo
que gera o amor à carne dito vulgo
coisa vaga.




amor é como os pronomes
se pode alterar a ordem
modificar-se-á algumas sílabas no arranjo
e mantém-se acima de tudo
o princípio batucado inicial
princípio verde e amarelo de roda
deixando de lado as outras cores
outros verbos
outras desgraças




apenas pronomes.




amor é pronome batucado de roda
sambado de samba,
é amor pronominal
de próclise, mesóclise e ênclise
de preto, branco e amarelo
e de tudo
e de todos.



Rodrigo da C. Lima Bruni

talvez

o redor tá ao meu redor
meu e de todos
tá por aí, escondido em algum canto ao redor do sentido da palavra
talvez de um verso
uma árvore
ou um corpo estirado ao chão



e ao redor dele tem coisas que não fazem questão somente de ficar ao redor
gostam da proximidade
do bafo na cara
da cara a cara com as pessoas
só para se manterem respeitadas
nessa cultura popular do medo do que se vê
do que se vem
e do que se tem
ao redor desse próprio medo de sabê-lo possível
e até rotineiro
esse medo inclinado nosso de cada dia
que nos dá hoje algumas ofensas
e não os perdoamos
e os mantemos ofendidos




ficamos assim
com medo
ao redor de nós mesmos
a cabeça baixa
o passo largo
o coração parado
frio e calculista
sem saber ter a vida curta que lhe foi prometida
e por isso poupa-se à diástole e à sua irmã



e ao redor tudo fica assim
taxado de normal
faixada de paz
até que o zumbido do redor
transponha a barreira invisível (mente transponível) do perto
e transponha também essa carapaça de desculpas remendadas e parlamentares



e quando alguém morre
não morre aqui
nem ali do lado
morre por aí,
morre pelas redondezas
morre ao redor



redor que é também barreira nossa
que também é nossa, a fuga
que também é nossa, a tristeza
que também é nosso pão de cada dia
pão mofado de cada dia
dia mofado de cada vida
vida mofada de cada redor




mas pai meu, que estás na terra
não mortificado, espero eu, sejas teu nome
que permaneça cercado em teu reino
em cima da terra, abaixo do céu



e diria amém
mas estou deixando de lado esse conformismo que circula ao redor
e provavelmente estarei morto daqui a horas
e talvez já esteja(mos)
apenas não saiba(mos).



Rodrigo da C. Lima Bruni

sede

amar não é como beber água, por capricho
há de se ter sede
os lábios secos
a mente, o corpo, o coração
a alma seca



há de se ter tamanha secura
afinal seria inútil seu capricho
caso fosse somente capricho
a escorrer, tolo,
por entre os dedos
diante dos olhos
mediante aos lábios



não, amar não é como beber água
amor não é embebido no amor
as vezes se encharca no ódio
se encumece de rancoroso,tamanho rancoroso amor,
que sofre por não ser mais amor
divino, límpido e puro
água cristalina
rio brando.



porém desagua no mar, esse amor
e o sal é triste e medíocre
deixando salgado, doce amor,
esse doce que é amar.



amor pode até ser água
que escorre diante das línguas
e que se amacia e personifica no tocar dos lábios
tomando forma de amor nosso
amor nosso! rancor humano



mas também pode ser água-viva
suficientemente auto-necessária de si mesma
que vaga nos oceanos
em busca sabe de quê.



não, amor não é só um
é tudo e são todos
é viver o dia de hoje
como o de amanhã
e o de amanhã como o último
sendo, o último, eterno
doloroso e eterno
amedrontador e eterno
finito e terno.



e se , salgado ficar
adocicai-o com algumas palavras doces
e se, ódio se tornar
amai-o com doçura de poucas palavras
e se, vazio se tornar
deixai-o desaguar no mar
pois foi eterno enquanto terno
e terno será enquanto assim o tiver
enquanto o amar



na sua trágica, dolorosa e póstuma morte rotineira
desse eterno amor nosso
que não é exatamente amor
nem exatamente nosso
e sabe lá Deus o que é
e saiba talvez o diabo de quem é.


Rodrigo da C. Lima Bruni

quinta-feira, 5 de março de 2009

temos?

o que temos?
a devastação
a miséria
a fome?



temos o que?
as armas
a tecnologia
as desigualdades?



e as bombas nucleares
os líderes de destruição
a corrupção da corrupção
que se corrompeu num nível inimaginável



diante do mais rústico princípio:
dignidade
temos sim, claro!
temos a nossa fiel desgraça



nossa filha
nossa cria
nossa!
quanto temos;



temos um quê
de sobrevivência
de coerência
de amor



de união
de mutilação do bom-senso
de morte por bom senso
de censo desnecessário



temos pra quê?
temos para somente ter
e na desgraça, nos reaver
desse pouco quê



quê de humanidade
que vive e crê
e vive e crê
e morre nessa eternidade.


Rodrigo da C. Lima Bruni

um parágrafo

já não sei o que me ocorre
papel e lápis me são traidores
coração nem é amores
e a razão nem é nada



e tudo é tão todo
que já não sei o que me ocorre
eu sou um de um
não poderia me saber como o todo



nem poderia saber-me
como um de cem
logo que sem
é ausência
e como me poderia saber não estando aqui



as rimas já nem sei mais
às rimas atribuo as curvas
as nuances
de uma estrada pedregosa e inexorável
de cabelos seios e desejo



mas não as sei
apenas as dirijo
seguindo alguns seguidores
ladeira libidinosamente íngreme (quase reta, de tão)



as poesias já me são fugazes
não sou mais são
mas elas são!
só não se entende a lógica delas



que é delas
só delas
por isso não se entende
por melhor, pois entender é tão monótono



também me sou
porquanto tal que me enjoo
e, porventura, caço outro de mim
em outro de mim
mais à isso não entendo



tampouco almejaria eu;
fadar a compreensão ao ser humano
é como traçar-lhe a morte.
a incógnita inóspita da vida
é tão mais vida quando a vivemos por sentida



ao invés de compreendida.
Minha razão me guia pelos seus caminhos
seus, não meus
minha razão é minha, deveras
mas minha razão não sou eu



e se á isso um pouco entender
é sinal de que merece ser ovacionado, leitor
logo que, esteja à frente de mim
mas não da minha auto-consciência



tenho plena consciência
de que não entendo nada
escrito até o momento
e à partir de agora me sei do que digo



o amor...
mencionei-o pois todo romântico o deve
e o deixei por último
pois dele, sobre ele e para ele
não me renderia nem ao menos



um mísero parágrafo amoroso.


Rodrigo da C. Lima Bruni

idéias quaisquer.

qualquer um,
como qualquer outro
com quaisquer outras
que o fazem um qualquer
sem qualquer ambição
e qualquer amor próprio.
Quaisquer que sejam as outras
serei sempre um "qualquer um".



qualquer palavra que me defina
seria qualquer coisa dita em vão
e qualquer coisa
nunca é qualquer coisa



qualquer um
em seu qualquer estado de sanidade
diria que são palavras quaisquer
em qualquer ordem
que não dizem qualquer coisa
e qualquer coisa
nunca será qualquer coisa
nem palavras quaisquer



qualquer palavra que se defina
não é qualquer palavra
é muito mais
acima do estar, do qualquer



qualquer vestígio de autenticidade
foi pra qualquer lugar
longe de qualquer um
onde todos são um qualquer
e o qualquer é a alma de todos
qualquer palavra de autenticidade
pode ser nada de alguém
ao invés de tudo de um qualquer


Rodrigo da C. Lima Bruni

fragmentação

juntei meus poucos cacos de mim mesmo
e remontei essa falsa réplica
de um terço de toda minh'alma
dada como extinta



e prescrevi umas poucas ilusões
antes que me ocorressem
apenas para não perder o gosto de sofrer
e não ter medo que se tornassem reais



menti alguns amores
apenas para que me fizessem amado
e me acalmassem o coração
que batia, e hoje tardo
a dar-lhe um motivo para bater



e confundi-me de mim mesmo.
incompreensível o porquê disso tudo
se ao final de tudo
pouco restou do todo
que não tardou desapegar-me



deixar-me apenas com esses poucos cacos
remontados com fita adesiva
e "sabeis que uma obra de arte nunca é a mesma
depois de quebrada"



e remontei minha obra de arte
como se fosse obra de arte
estas, que são complexas como Deus,
perdem a essência quando quebradas
e se tornam apenas uma obra



e não podem ser remontadas
apenas reinventadas
sem nunca serem as mesmas
sem nunca terem de si mesmas
a essência que lhes foi tomada pela tragédia.


Rodrigo da C. Lima Bruni

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

ilusória.

sou prostituto
desde que me entendo por mim



já passei por vários corpos
já me deixei seduzir pelo mais perfeito sexo
ainda que resida uma ambiguidade à isso.



me (bem)digo profissional da ilusão
e afirmo me satisfazer com pouco mais de umas fiéis esperanças como pagamento
firmo satisfazer á todos.



aos enfermos
aos doentes de alma
e ás almas enfermas por doentes de si



já escorri pela sarjeta
me embriaguei o suficiente pra me achar bom
e achei bom a ironia que à tudo isso se mostrou franca



Que poderia almejar?
tão somente profissional
porquanto tal
que o próprio gozo que me detém
é o mesmo pelo qual me abstenho



e abro mão sem nenhum pesar
abro minhas mãos á quem quiser
somente não me abro
pois abrir-me o total sentido
seria encerrá-los em plena desgraça



e se algum sentido á alguém se mostrar
será sentido e compreendido como eu o deveria
com o coração,
por onde mais vago, sem razão
e que posso fazer
se sou, tão somente
um velho, usurpado
condenado
e foragido prostituto.


Rodrigo da C. Lima Bruni

a arte

sem garbo
eufemismo
ou eloquência



arte é arte
feliz e fiel a si
arte é parte



fração de nós que não parte
que não é nossa
(como nós somos dela)



está no mundo
tão somente por ser necessária
por ser sensível
e há(ver) de ser sentida



tão inculta e pouco pudenda
que se revela à quem lhe revela a alma
lhe vela um motivo pra viver
para ser ( e há de ser) arte



a pintura nos colore rimas
a poesia nos (a)figura, Amor,
sua vida



pois há de sacrificar-se
para ser sentida
para ser arte ainda que (tragédia!) póstuma.



arte é parte
feliz e fiel em si
e das milhões de partes
uma nos cabe
e cabe em nós milhões de artes.


Rodrigo da C. Lima Bruni

rosa de plástico

viva ao ar mal beijado
do incorpóreo amor que nos inspira
e expira
ao final de respiração lenta e ruidosa



e dolorosa
que por tanto doer
se mostra rosa
de espinhos e pétalas de plástico



que nos plastifica a perfeita e digníssima razão
razão nossa que é dela
que de rosa apenas o nome detém
cinza é sua real cor



névoa é seu aspecto, seu tato
névoa espessa e dura como rocha
neve seria sua real sensação
mas esta só assim se afigura tardiamente



e a tarde ao menos tarde é
para quem realmente lhe descobre
para quê realmente a descobrir?
vamos plantar sua semente e colher seu falso fruto bendito



vamos ao Amor, semear nossa cara
e fazer dele humano
ainda que rosa de plástico
vamos fazê-lo plasticamente humano



vamos fazer dele nós mesmos
e de nós, rosa de plástico
para assim ser (in)quebrável
esse amor nosso (que somo nós)


Rodrigo da C. Lima Bruni

cantos e encantos do silêncio

o silêncio é muito mais gostoso
quando apreciado sem pressa
sem pretensão



e cada gota que transborda seu prazer
é prazer aos ouvidos de quem o toca
de quem lhe exerce o tato com a alma



me lembra a beleza do canto dos passarinhos
tal encanto o meu!
tal que meu canto seria ribombante
acima do silencioso tom audível dos mortais



seria inaudivelmente imortal
esse silêncio dito canto
e cá no meu canto
o romper seria me prorromper em trombetas



em sopros de pesar
sopros inaudíveis de tão introspectivos
porém meu silêncio, que minha algazarra habita
teria seu silencioso coração cortado de dor e angústia



caso ocorresse.
e lhe ocorreria
a tentação do costumeiro suicídio



que me fadaria a algazarra extrospectiva
a algazarra mundana
a algazarra imortal



silêncios são orgulhosamente sentimentais
e quando nos fazemos à menção de abandono
se suicidam
pelo mais belo amor à sua integridade silenciosa



póstuma tragédia esta
na qual me queixo do meu silêncio
que já se alimentou de mim
e aqui me alimento dele



silencioso, terreno e mundano
o digiro à largas garfadas
o dirijo pelo meu corpo



esse silêncio intra-venoso
essa coisa que vai ser sempre minha
e minha será a morte



sempre que acordar para a algazarra
serei eu, o morto
que me farei ele
para este nunca mais se dissipar



e ser, assim, eterno
e à isso não encontro um fim
aqui escrito
porém, inscrito e proscrito, já sabeis...



(silêncio)


Rodrigo da C. Lima Bruni

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

declaração da tristeza ao amor

eu sou fruto do vento
por minh'alma ao relento
sou dor sou descontentamento
sou "viver a vida em detrimento"



não sou tão
ao menos tanto
nem sempre desenlaço teu pranto
tampouco enlaço-me de teu encanto



e talvez seja pouco
tão pouco o senso
por me ferir de descontentamento
como se sua companheira não estivesse sendo



e porventura malfazeje-me
de suplício porquanto
te acompanhe no pranto
e sem mim sejas pântano



mas sabes que de todo o mal
não sou o mal
e caso me abrasasse teu peito, talvez
não fosse tão sinonimo de escassez



e pudéssemos assim
eu, cá com minhas desgraças
tu, em si com tuas desgraças
unir-las



mas não
deixais a vida correr
você me correr
e me apodrecer



afinal é assim mesmo a vida
afinal à vida não me resta nada
ao final de minha vida
minha própria desgraça me fada



a morte.
e peço que Deus
tenha piedade de minha alma diminuta
que por ti, tão massacrada



agora se transmuta
nessas tolas desculpas
de sincero platônico amor
de toda minha alma não amada.


Rdrigo da C. Lima Bruni

retórica sobre o amor

o amor é tão somente amor
quando a materialidade do orgasmo
e a complementação de almas
é verdadeira



ambas e mutuamente verdadeiras
devido à isto muitos que acham amar se enganam
satisfatoriamente enganados.
Outros dão se por satisfeitos pelo coração ou pelo desejo



não ambos, "não se pode ter tudo na vida".
A verdade absoluta é: não amamos
o ser humano nunca amou
e tão provavelmente nunca amará



seremos extintos
diante de eras nos ludibriando
e ludibriaremos até o amor
o fazendo à nossa imagem e semelhança



e amaremos com esse amor nosso
criado em laboratório pessoais do dia-a-dia
desenvolvido em tubos de ensaio de sonhos
e abortado



antes da alcançada perfeição perfeita
imperfeitamente antes do perfeito sentido literal da palavra
amaremos nessa material futilidade
e alguns podem ter a sorte de tomar uma dose desse drinque



porém nem sempre curam as enfermidades do coração
se drogar pode parecer mais fácil...
mas viva ao nosso amor, à nossa vida!
ambas coisas que não estamos nem perto do real conhecimento.


Rodrigo da C. Lima Bruni

a beleza, o singelo e o amor

amor tão belo amor
que por tão belo, desconheço
amor falado amor
por tão falado me apeteço



o querer acima do querer
que por tanto desanuvia-se
e de tanto desanuviar
desaparece por cada linha



de amor escrito e inscrito
de amor rimado em poesia
de amor sincero, amor gostoso
amor que tanto me almejaria



porém, meu amor tão belo
belo és em cada linha
amor desconhecido de tão singelo
desgraço este amor (que meu amor tinha)


Rodrigo da C. Lima Bruni

alma inquieta

irrequieta-se perante o nada
é um gosto bom
demais até para gostar-se



é uma rotina
tão docemente aleatória
que se torna aleatória, perante si



soa como música
aos ouvidos de quem não a quer ouvir.
O cego a olha nos olhos
e o amante a ama a cada procura por um novo amor



é fracionada nos momentos
e a cada fração de momentos
fraciona-se em um enésimo de sua inquietação
despedeça-se perante à recusa de seu estado



negá-la é viver extracomungado de si
é cheirar uma flor
e sentir o cheiro acre do vazio



como amar
e gozar da carne , tão somente
como beijar sem ser beijado



esta é como o amor que surge
ao qual, nos resta apenas amar
e quando este se vai
ela mesma nos incentiva a outro



negá-la é abduzir de nós mesmo
a beleza desta
que é linda
enquanto a temos como



deve-se aquietar perante sua inquietança
e deixar-la conduzir por aí
por estradas de outras almas inquietas
e que da interação destas se faça a perfeita interação!



Rodrigo da C. Lima Bruni

domingo, 4 de janeiro de 2009

os braços a volta e você

meu braços estão a sua volta
e você ainda me volta
lembrando o que sou pra você



minha volta nem sempre é uma volta
as vezes ela se solta
e se perde do sentido da palavra
adquirindo no meu sentido o lazer



às vezes você se solta,
e me revolta,
em beijos-discussões rápidos como um incêndio
que brota
duma fagulha em uma folha
simples e absorta



às vezes se entorta
em convulsão ora de raiva
ora tesão
e nos expurga
qualquer ínfimo motivo de discussão



às vezes se importa
demais com as importância que se fazem em vão
às vezes você se encontra
no meu perdido sentido de razão



às vezes você é demais você
às vezes demasiadamente eu
às vezes me perco em você
como você se perde no breu.



às vezes,
somente às vezes.


Rodrigo da C. Lima Bruni

últimos minutos

assim me vejo nos últimos minutos:
tão cheio de pessoas
tão vazio de mim
tão completo meu corpo
tão incompleto o fim



e lágrimas rolarão sobre meu peito
não minhas, já estarei seco de amor
lágrimas dos presentes, tão ausentes
vagos, presos no interior



dos seus sonhos e esperanças
ricas de inocência e pudor
esperanças de vida extra corpórea
vãs, ao se concluírem: imensa dor



e flores descansarão ao meu repouso
flores descansarão enquanto eu durmo
pessoas chorarão, e chorarão
e morrerei assim, separado e junto



de mim, por mim e em mim
amém.


Rodrigo da C. Lima Bruni

quietude de aceitação

ó, como queria te deter
me manipular o sentimento enviesado
e me fazer redoma de ti


como queria a dor em seu peito
a finitude do adeus por mim dado
e minha sombra de solidão: seu afago


o que me assombra
é me sentir fora de ti
mesmo estando em comunhão, minha Deusa


o que me entristece
é ver teu ódio sólido e irrefutável
crescer dentro e fora de ti


o que me deprime
é saber que suas carícias já não suficientes
tamanha essa lepra de mim!


...


Deusa de marfim
seu fiel não lhe é mais fiel
confessado isso, aceito todo seu ódio de bom grado


e essa desgraça é só minha
e de mais ninguém.


Rodrigo da C. Lima Bruni